Sobre
instauração de processos emancipatórios e outras configurações
(O que posso dizer sobre processos
emancipatórios a não ser a partir da minha própria experiência nesse exercício
de expor-se ao outro e a si mesmo na construção de novas subjetividades...)
Adriana Amaral
Artista Orientadora Vocacional Artes Visuais/2013
Artista Orientadora Vocacional Artes Visuais/2013
Iniciar um processo, seja ele
qual for sua natureza, implica lançar-se em direção ao novo. O que muitas vezes
beira o risco de estar diante do desconhecido: o sair constantemente da zona de
conforto, das nossas verdades e caminhar à deriva na busca de algo, que muitas
vezes só torna-se claro quando o encontramos. Mas, a questão é: como sabemos que
o encontramos, ou nos encontramos? Nem sempre os encontros acontecem, o que também
é um risco e ao mesmo tempo, se pensarmos no lugar do encontro, ou de cada
encontro, podemos torná-lo um desafio, que diferente do outro, isoladamente, nas
estruturas das paredes precárias, traz consigo o que chamamos de intenção, o
querer estar no risco da descoberta. Essa talvez seja a natureza nômade de se
instaurar processos emancipatórios no universo das construções poéticas e das
relações humanas, dentro dos encontros aos quais nos propomos no programa
vocacional.
A intenção aqui não é desenvolver
uma dialética dos encontros, mas inevitavelmente, existe uma necessidade de
compartilhar, tal reflexão. Pensar o encontro não como fim, mas ponto de
partida para o lançar-se do outro na busca de suas ansiedades, não sendo possível,
de imediato, mensurar ou equalizar em resultados, mas sim em algo que se torne
vivo, latente, pulsante. Então, que o vocacionado possa vir não mais apenas
diante desse encontro, mas ao encontro de si e, talvez, seja aí o sentido de
pensarmos em processos emancipatórios, quando nos colocamos para além da
apropriação, quando adentramos o território da ressignificação dos sentidos e
da valorização do sujeito, do outro, que se faz presente.
Propor processos emancipatórios é
de certa maneira lançar-se também ao desconhecido, uma vez que para cada
processo instaurado, muda-se o tempo, o lugar e as relações. A palavra processo, também nos traz a ideia
de construção, que por sua vez nos remete a etapas, trazendo consigo a
experimentação das possibilidades e impossibilidades do próprio processo.
Instaurar processos emancipatórios é de alguma maneira provocar no vocacionado a
vontade de arriscar-se no universo da experimentação, de dialogar com as suas
próprias possibilidades e impossibilidades, de se ver como agente propositor.
Mas, para isso, é necessário quebrar com as nossas próprias certezas, com o
nosso porto seguro dos discursos e das referências, e nos lançarmos para o
encontro dos sujeitos. Assim, que possamos dar voz e ouvir o vocacionado, sendo
necessário o nosso próprio processo emancipatório das nossas verdades. É
preciso pulsar, sentir essa natureza nômade do encontro, que muitas vezes só se
faz no ato, e o que isso pode dizer? Pode dizer, talvez, que no desafio do
risco, das paredes precárias do risco, o encontro não se dá no lugar, e sim no
tempo da experiência, o quanto isso atinge cada um de nós... Mas, é claro, às
vezes faz muita falta o vermelho e amarelo cadmio, o azul cobalto e uma
charbonnel... Mas isso, talvez, não tenha nenhuma relação com processos emancipatórios.
Processos emancipatórios, afinal
do que falamos? Para além de linguagens, proponho subjetividades, diante do
outro e de si. Não se trata de uma afirmação ou negação do sujeito e sim de um
expor-se, quando nos colocamos, de certa forma nos despimos das imagens já
prontas. Expor-se acarreta o risco do negar-se ou assumir-se como tal.
Emancipar-se seria despir-se, expor-se e não anular-se, ser visto em sua
integridade e poder dar voz à ela. Então, que o vocacionado tome a voz e que a
linguagem nesse momento possa tornar-se arte. Isso pode ser que seja, talvez,
um processo emancipatório, mas que se dá no tempo e não nas paredes precárias
do lugar...
Processos emancipatórios demandam
tempo. Tempo do encontro, da experiência, do lançar-se para si e para o outro,
do despir-se e expor-se constantemente e do tempo das estruturas das paredes
precárias ganharem força.
Uso muito a palavra experiência, descobri
nos textos de Jorge Larrosa¹, e se não estiver equivocada, na sua atribuição, a experiência
é aquilo que nos passa. Aquilo que fica e que de alguma maneira nos toca e transforma,
que nem sempre consegue ser traduzido, mas está lá, latente, pulsante, vivo. Processos
emancipatórios, talvez, se relacionem com isso, com algo que nos passa e nos
torne maior, sem tutelas, ou muletas. De fato, elas nos ajudam, mas se acreditarmos
também em nossas vozes, elas ecoam.
Ao despir-me aqui quero dizer que
algo passou em mim e que ficaram algumas construções poéticas de subjetividades
latentes, vivas, pulsantes. Vozes, que talvez só ecoem em um outro tempo, fora
das estruturas das paredes precárias, e que isso, talvez, tenha alguma relação com
processos emancipatórios.
¹Jorge Larrosa Bondía é doutor em pedagogia pela Universidade de Barcelona, Espanha. Publicou diversos artigos em periódicos brasileiros, entre eles: Notas sobre a experiência e o saber de experiência (Rev. Bras. Educ, 2002) e tem dois livros traduzidos para o português: Imagens do outro (Vozes, 1998) e Pedagogia profana (Autêntica, 1999).
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