PUERIS – UMA ELEGIA AO TEMPO
Ainda que não seja, eu fui, sem sê-lo.
Por Hercules Morais -
CEU CASABLANCA - SUL - TEATRO
“O teatro é síntese, mas não brevidade”.
(E.
Nekrosius)
Geralmente,
nos domínios das artes, tem-se olhado mais aos frutos do que à árvore que os dá
ou cria. Nesta esteira mora o aspecto dinâmico da criação artística,
acompanhando-a desde os seus intentos primórdios até à sua definitiva eclosão.
Visto a produção artística não ser mera conseqüência do acaso, mas antes
elaboração sensível e formação/interação adequada, o presente rascunho em
linhas tortas, em palavras suspensas, visa apontar este limiar sensível do
homem e seu entorno, nas organicidades vivificantes que nos tocam, para do
subjetivo ir ao objetivo, o caminho inverso ao filho pródigo, morrer e depois
nascer, as palavras que se desprendem terão inspiração na arquitetura - no
paisagismo de Burle Marx - na física - no principio da incerteza de Heisenberg
– uma elegia aos quarks, aos fótons e a todos os grãos de poesia do invisível
que nos esclarecem e intrigam.
Esses
retraços/retratos surgiram sentado no olhar que mira o muro do banco mal
posicionado. Ali meu universo em uma casca de noz nasceu. Do fóton a
universalidade do todo, o principio das matérias sólidas constituídas de luz.
A
biblioteca vazia e fria me configura em estética relacional aos tempos vacilantes
de nossa contemporaneidade, os freqüentadores do CEU não há vêem. Assim este
exercício do efêmero - passeios ao léu – buscará relatar em retrato textual no
limite da linguagem a descrição do fenômeno que ali se passa.
A
dinâmica arquitetônica do CEU, compreende uma tensão entre aquilo que se propõe
e aquilo que se verifica na prática, o que afinal significa Centro Educacional
Unificado? Quando piso os pés nesta arquitetônica conjectura filosófica, não
deixo de relacionar a Bauhaus e seu empenho de diálogo silencioso daquilo que
se constrói em tijolos com aquilo que se visa construir em devir humano. A
idéia por trás estaria na não dissociação entre áreas - o fim da hierarquia – com
vistas a formação integral, os “blocos” cultural, esportivo, didático seriam
todos funções complementares de um projeto da educação integral.
Para
isso foi pensado um desenho arquitetônico e funcionamento próximo ao que o
comércio sabiamente apropriou-se hoje, a exemplo: escadas rolantes em shoppings
que te obrigam a circular por todo o espaço, sendo atravessado por promoções,
cores, cheiros, sapatos, roupas, bolsas, ainda que seu objetivo primeiro era
apenas ir ao banheiro nos caminhares apressados de nossa experiência moderna,
essa inteligência da organização do consumo prova que pelo menos com um
sorvetinho você vai sair. Assim deveria ser projetado o CEU sermos bombardeados
por atividades que nos formam para além de nossos limitados objetivos iniciais,
possibilidades formativas com vistas a esta educação integral em todas as
potencialidades humanas, e que saíssemos pelo menos com um livrinho de poesias.
Na
exploração e verificação da relevância deste ambiente de formação, criação e difusão, defendendo a compreensão
de sua atuação, como forma ampliada de atender as necessidades de pensar os
processos de ensino e aprendizagem em artes cênicas que nos ligamos como
artistas que pensam seu tempo, e relacionam as possibilidades estruturais e a
relação com o que podemos interferir.
Neste
apontamento artístico-pedagógico da exploração do ambiente como vivência, se
mostra a possibilidade de completude, artista-criador, que reflete e
aprofunda-se em seu próprio processo - partureja-se em dor e alegria – se o
fruto que aqui citamos é traduzido em beleza e obra, o fenômeno não se dá
espontaneamente, é antes o produto deste esforço da vontade criadora que
caminha essencialmente nas circunstâncias adequadas suprimidas e fomentadas por
este ambiente de formação, o local
adequado para que se dê.
Na formação do artista, do vocacionado, do cidadão, do homem, na
formação da formação, o conhecimento da técnica é necessário para dar vazão à
intuição, mas o essencial é a elaboração de sua visão de mundo. Este busca, por
meio de uma linguagem singular desenvolvida ao longo da vida, compartilhar seu
olhar. A obra de arte surge quando o mesmo consegue lançar um olhar crítico
para o mundo e elaborar sua transmissão por meio de uma expressão própria.
A criação artística liga-se deste modo ao processo formativo
educacional, criar em arte é um tormento enquadrado na moldura da inteligência,
da vontade e da técnica e a exploração do tempo e das condições adequadas pode
configurar-se em obra e processo emancipatório. Aqui não interessam os frutos
colhidos verdes, tampouco os maduros, interessam à qualidade das sementes,
sobretudo, a do solo, assim o tempo será o senhor da criação e sempre as safras
serão consagradas nos encaminhamentos da própria natureza...
“Se a gralha faz ninho
baixo e o melro alto
Haverá muita chuva nos
meses de verão
Se o melro faz ninho
baixo e a gralha alto
O verão será seco e
quente”
(G. Bidault)
Quais
experiências artísticas poderiam dialogar com toda essa dinâmica de arquitetura
de nossa modernidade liquida? Estes pensamentos todos deveriam ser escritos por
um sociólogo? Um educador? Um engenheiro? Um arquiteto? O que são as funções? A
emancipação estaria no entendimento ativo do homem por trás da função? O jovem
que não se limita a uma função ou cargo para pensar e, responder em arte o todo
que o cerca, que o forma, que o deforma?
-Como a precarização dos
espaços públicos pode interferir nos processos
criativos?
(Silêncio).
-Como um artista
orientador e um grupo de teatro se veem obrigados a utilizarem-se do rasgo de
uma cortina para construir uma estética de um espetáculo?
(Silêncio).
-O
que significa melhorar?
(Silêncio).
ASSIM
O SILÊNCIO DO BURACO NEGRO CRIOU NOSSO BIG BANG.
Ao
descobrir a consciência e a relação propostas em uma formação cultural os
sentidos recobram sensações e, como conseqüência recobramos a nossa própria
existência.
O
CONSTRASTE ENTRE O PROCESSO E A INTERVENÇÃO
Como nomear o que aí
nasce se toda palavra é limite, sinal-a-menos e a realidade sinal-a-mais?
(Affonso Romano de Sant-Anna)
Da Vinci olha para um
bloco de mármore e tira as sobras da escultura que ali já habitava.
-Como fala isso?
-Como é o nome disso mãe?
-Por quê? Por quê? Por quê?...
-Mãe, as coisas que a gente vai fazer, mas ainda não fez, elas
existem? Tipo esse quadro aqui. Antes do pintor pintar ele, ele já existia?
Ao passo que
passa o menino e a mãe caminham de mãos dadas, tementes em atravessar na faixa
a vida que transpassam. Dar nomes – ato humano por excelência – nomeando,
pretendemos inscrever em nossa inteligência o ser do que foi nomeado. Em
retraços sublinhados na companhia de meus grãos de poesia, escrevo, transcrevo,
me meço, me excesso em escrita compartilhada com Perissé. Trazemos o objeto
extra-mental para o âmbito da nossa consciência. E, a partir desse momento,
podemos atuar sobre ele: para conhecer e cuidar, ou para manipular e destruir.
É divertido
ver o menino que cria sua maneira faceira de fazer arte, de fazer ontologia,
‘ontologia’ palavra que amedronta, mas é constitutiva de nossa inocência/indecência,
do menino que corre nu comendo a maça antes do pecado original, nas gêneses em
gênesis? Essa gênese passiva deve compreender a interioridade do meu próprio
universo, em emoções, sentimentos, volições, hábitos e tudo mais que emerge da
estrutura de meu corpo. Na gênese ativa envolve a operância da atividade
perceptiva da exterioridade, isto é, todo o fluxo da consciência intencional
voltado para a busca do sentido, da estrutura eidética da objetividade,
eidos/idéia ‘aquilo que se vê’ no sentido empregado por Homero, assim estrutura
eidética da objetividade, como um dado que já está aí, na envolvência do âmbito
inteiro da experiência.
Olavo Bilac no Caçador de esmeraldas:
“Fernão Dias Pais Leme
agoniza. Um lamento
Chora longo, a rolar na longa voz do vento.”
...estendeu para além
das palavras (invadiu nossa percepção) o rolar do lamento pela morte do
bandeirante – a aliteração empregada com maestria. O /o/ em
lamento/chora/longo/rolar/longa/voz/do/vento, o /r/ em chora/rolar e o /l/ em
lamento/longo/rolar/longa combinam-se ao /v/ em voz/vento, à rima lamento/vento
e ao jogo longo/longa, alongando a voz chorosa que se desprende do ar, como se
a própria natureza estivesse em agonia. Rolar em configuração fonética, é palavra
que desliza – visualmente - na escrita, no arredondamento dos lábios de quem
ouço pronunciar, sugere rolamento, consoantes liquidas /r/ e /l/
correspondentes ao movimento desimpedido e continuo.
O que já
estava ali? A Natureza que jazia em agonia? Ou a invenção fonética da
transliteração do mundo em palavras? O rasgo da cortina já existia?
Os poetas,
em geral, aprendem a lidar com essa realidade e nela se sentem como peixes
dentro d’água. Nem controlam totalmente a linguagem nem são por ela totalmente
controlados.
“O idioma é
a única porta para o infinito, mas infelizmente está oculto sob montanhas de
cinzas” assim disse Guimarães Rosa. Que não poderia ser outra cor se não rosa,
cor e flor, é imagem de poesia nos primeiros encontros de amor, os inícios de
namoro que ofertam rosas, é perfume, Rosa, é a confluência dos sentidos em
sentidos, a síntese da obrigatoriedade de ser que se foi. O poeta que aqui tece
suas conexões têxteis, inventou o sentido da Rosa? A Rosa em Guimarães é
sobrenome ou natureza que já existia? Que já estava ali habitava? A Natureza que
jazia em agonia? Ou a invenção fonética da transliteração do mundo em palavras?
Antes de o poeta nascer ele já existia.
Lançado a
verificar nas etimologias as perguntas do pequeno menino grimpante,
a pergunta para a mãe e seus redobros, dois dobros, re-dobros, de rolar, pedra
que rola, mãe e filho, as pedras da existência que rolam em fio umbilical...
“Amor” encontra-se com “mamar”, ligado vivamente ao infantil “mamãe”, balbucio
do bebê ao colocar na boca seio materno (e “bebê” é balbucio também, da mãe
amorosa que imita os balbucios do filho). Amar é dar este beijo em quem entrega
o seio morno e alimentador, beijo que suga mas ao mesmo tempo dá prazer a quem
se entrega.
“Antes de existir
alfabeto existia a voz
Antes de existir a voz
existia o silêncio
O silêncio
Foi à primeira coisa que
existiu
Um silêncio que ninguém
ouviu”
(Arnaldo Antunes)
Podemos
então retomar uma das perguntas do início, é possível “ensinar” alguém a
escrever e relacionar com sua história? No fundo seria como se nos
perguntássemos, é possível ensinar alguém a olhar para o mundo, para o outro,
para si mesmo? E mais especificamente, é possível ensinar alguém a deslocar
esse olhar, a trazer para a criação, relação, compreensão algo que nos
surpreenda, e principalmente, que não se esgote no próprio instante? Certamente
não, não há fórmulas. O que não significa que não seja possível apontar
caminhos, aprendendo caminhos, fazer e ser feito, ao nos depararmos hoje com as
páginas do Quixote, nos permitimos ter acesso a algo que, mais do que a história de
alguém que enlouquece e se imagina cavalheiro andante, é o olhar do autor para
um mundo que se extinguia, e continua se extinguindo (outros mundos, outros
homens) a cada leitura. A origem da palavra texto vem do latim, textus, têxtil.
Portanto, a mesma origem da palavra tecido construção de uma malha de linhas
formando um todo vigoroso e uniforme, texto o emaranhado de idéias, palavras
articuladas, pensamentos e construção de sentidos.
Escrita refletida Têxtil de nosso processo, linhas de idéias
“Depois do Suzuki fomos assistir aos filmes do
Expressionismo Alemão, A Paixão de Joana D’Arc e Nosferatus. Pudemos observar
máscaras, fotografia e construirmos um olhar acerca de nossos exercícios e
sensações já vivenciadas e do que estávamos visualizando nos vídeos. Expressões
muito fortes, como o olhar profundo de Joana D’Arc, as conversas dos seus
jurados, um cinema mudo, carregado de um simbólico multifacetado e que jogava
fortemente com emoções e gestos. Já em Nosferatus, víamos fotografia, cores,
narrativas, que corroboravam ao expressionismo. O que dialoga com nosso
embasamento filosófico-epistemológico da criação e imersão no estado poético.
Esse tônus sinergético só é possível se bebermos de múltiplas fontes
expressivas artisticamente e se estudarmos a fundo a criação humana e
sinestésica.
Partimos depois de assistirmos ao filme para um dos
exercícios – que na minha concepção – foi um dos mais profundos que já
desenvolvemos. Uma manifestação livre de emoções, gestos e expressões tendo
como referencial os filmes assistidos. Dentro desse caleidoscópio plural e
multifacetado pudemos experimentar um exercício muito denso e permeado de
fortes emoções. Emergiram gritos, choros, risadas, todos viscerais e profundos
de poesia. Foi uma catarse coletiva, muito perto de um surto. Foi um estado de
experimentação, investigação e vivencia cênica que marcou a trajetória do nosso
grupo”.
(Daniel Hernandez)
“Nosso orientador nos
informou que veríamos um filme|doc chamado QUEM SOMOS NÓS esse que trata sobre a ciência da metafisica (uma
das disciplinas fundamentais da filosofia) a palavra possui origem grega e
significa:
Meta: depois de, além
de.
Fisica|Physis:
natural ou físico.
O assunto abordado é um grande alimento para mente e
alma, e tem como objetivo estudar a ciência do mundo, a causa e a consequência,
ação e reação, tudo é vai e volta. A liberdade, o sobrenatural, a causa
primaria para todas as coisas, qual o papel que desempenhamos em nosso planeta.
Matéria X espaço, se realmente estamos onde estamos os universos paralelos de
cada ser humano e as suas ligações. Tudo o que me rodeia é constituído por
átomos. O mundo subatômico! Sendo assim somos uma coisa só, um grande
aglomerado de átomos e constituímos um objeto chamado Planeta Terra. Sou uma
partícula de um sistema, que faz parte de outros sistemas, mas a forma que
interagimos é a questão, como essa energia é distribuída de qual forma os
vínculos são realizados e como eles são desfeitos e depois de tudo como são
reajustados.
A nossa energia não limita-se apenas a nós mesmos, mas
transcende as barreiras do imaginário e tornasse real, provando assim o nosso
grande potencial, podemos ser o que quisermos ser, podemos chegar onde a mente
nos levar, e podemos levar nossa mente e matéria a um alto nível disciplinar e
fazer coisas realmente inimagináveis. Todos somos um. Fazemos parte de um
organismo em que agimos individualmente, mas não vivemos sem a
interdependência, a troca de energia, uns conduzem e outros são conduzidos.
Temos de ter ciência de nossa grandeza enquanto seres humanos, do nosso
potencial.”
(Wagner Ribeiro)
“Complicado explicar o tudo vivido, sentido, e compreendido
dentro da caixa preta, é complicado também explicar o tudo Vivido, Sentido e
observado Fora da caixa preta. No começo tudo era confuso primeira aula, fui
sozinha, ninguém me arrastou até ali, pessoas novas até esqueci o nome do
Orientador, Mais eu estava, ali... Buscando algo. Apresentamos uns aos outros,
nome, idade, profissão, meio de práxis foi o que pensei; A cada semana me instigava
mais a querer estar ali não era as pessoas não era o professor não era o local,
Era eu, eu queria sentir como é eu queria saber o que eles estavam falando que
na primeira aula me pareceu gregos e confusos. Hoje sei exatamente o que era
aquilo que disseram nas aulas anteriores fui aprendendo, vivendo, e
compartilhando. Teria que escrever um livro pra contar tudo o que foi, mais
quero apenas uma única folha. Existem marcas, sentidas, escondidas, mostradas,
excluir essas marcas, de um passado, do presente, limpeza corpórea. Ah Antunes
filho talentosíssimo, ah joana´darc expressionismo, Ah Bach grande Bach! Maria
Callas alma, Bergman silêncio! Livros, poemas, nossa querida e transformada
biblioteca, Pessoas e suas historias de vida, Criações, criadores, Criaturas,
”Montrinhos”. Foram 6 meses pra ser mais exata, de trabalho, dedicação,
de aprender a ser humano e agir como um, ver através de um olhar, através do
delicado, dedicado, sentido, de usar a naturalidade como o natural para mostrar
uma verdade, dita, não dita, sentida, não percebida, encontrada, Foram e são
muitos passos ainda a serem dados, em que ser aluno era também ser orientador e
orientador era ser aluno sem diferenças sem limite para o novo e para a
descoberta do novo, onde todos sentiam como é, como fica, como toca, o que
sente, o que liberta.”
(Talita Guidio)
“Ver o universo, olhar o mundo, observar pessoas, ouvir
humanos, respirar, inspirar, sentir alguma coisa.
De tudo que nos ocorre a cada dia, a cada momento, que
talvez mude ou talvez não e nos faça pensar, pensar em cada momento ou em
momento algum. Aos círculos que nos cercam até desfazermos aos poucos e nos
reconstituindo em nós mesmos. Então temos um conjunto de coisas, coisas
estranhas, insignificantes, incompletas, gerando dúvidas, o que são estas
coisas? Para que servem? O que são coisas?
O universo como linear se recompõe em si, continua em
expansão, se recria a cada momento.
Então elas respiram. Este respirar para um essencial.
Este espirar para um começo.
Foi posta uma mesa de experiências/informações que nos
foi dada para escolhermos com qual querem nos cortar, então pegamos espadas,
machados, guilhotinas! Mas ai a música toca, suavemente/brutamente, e fecha as
feridas e deixa somente as marcas”.
(Gabriel Andriola)
“O TEXTO É PRETEXTO PARA O SUBTEXTO! É brilhante como
ocorre a cena, as falas ‘não faladas’
que acabam existindo dentro da nossa cabeça, não é preciso dizer para se fazer
entendido mas apenas estar, ser e querer!
Para finalizar deixarei a minha impressão da nossa roda
final, nenhum entusiasmo e teve momentos em que o silêncio imperou, esteve mais
nítido do que nunca, que existe medo dentro da gente, medo de falar, de ser
ouvido, de ver, de ser visto, enfim de estar aqui. Me indaguei!!! EU CAMINHEI,
EU RESPIREI, EU DESEQUILIBREI, EU FIZ EXPRESSÕES, SENTI A DENSIDADE DO AR, ATÉ
‘ENLOUQUECI’, GRITEI, RI ALTO, CORRÍ NESTAS MADEIRAS! Tudo para receber a arte
dentro de mim, tudo para que ela se apresentasse para mim, como um eu
disponível, um eu que transmite. O que nos motivou a vir aqui foi estar sobre
estas madeiras, Atuando. Mas nos foi dado muito mais que isso, nos foram dadas
as ferramentas para a construção de nós mesmos e agora temos medo de fazer algo
de nós”.
(Priscila Gonçalves)
“Uma proposta simples, entrevistar alguém, ouvir uma
pessoa contar sobre seus medos, suas alegrias, suas experiências de vida. Nada
mais simples que isso. Parar e ouvir alguém. Justamente nesta simplicidade
estava, na minha opinião, o coração daquele processo que o Hércules orientava.
Em algum encontro agente falou sobre, espada, corte, feridas. Fui cortado.
Jamais serei o mesmo depois deste processo. Fazer as cenas como recortes da
vida que nós mesmos não paramos para observar, a experiência de ser o criador
de minha própria obra, de me sensibilizar com o cotidiano e ver ou transformar
isso em poesia, o simples e rico ato de ouvir o outro é algo que ninguém,
jamais vai me tirar, é pra toda minha vida.
Já pensou se eu tivesse desistido?
Durante todo o processo a gente passou por Callas, butô,
fomos do Expressionismo ao Impressionismo, trabalhamos com respiração, ar,
movimento, falamos sobre história, filosofia, etimologia, religião, música,
artes plásticas, Bach, discutimos a respeito de Unvelt, campo tácito,
metafisica. Erramos, acertamos, choramos, rimos, nos sensibilizamos, fizemos
amizades, tivemos despedidas, mas o que importa mesmo é a experiência, a
vivência de tudo isso e como artistas – criadores que agora somos encarar cada
uma dessas coisas como parte de nossas obras”.
(Romário Lopes)
“Sobre a Educação da Sensibilidade,
Não teria um nome específico para
definir, mas vamos chamar de uma peça. Ao decorrer do ano fomos montando
recortes/cenas tentando no mais íntimo de nós, dar um ar de realidade aos
nossos movimentos, falas, ações e até mesmo pensamentos.
Nossas cenas também surgiram através de
conflitos, incômodos, questionamentos e aflições, que nos causaram uma
metamorfose silenciosa. Podemos dizer que tivemos uma overdose de informações,
conversas complexas e profundas, que no mais íntimo de cada um de nós, nos
transformou de certa forma. A vida está ai, não para, o tempo passa e a
história vai acontecendo, pessoas nascem e morrem, deixam exemplos, esperanças,
perspectivas diferentes do mundo. Abrimos uma pequena fenda no espaço, para
poder ver as coisas que talvez não víamos antes. Eis ai a dança dos planetas,
cada um com seu movimento, acrescentando a cada instante. Abrimos os olhos, mas
podemos enxergar com eles fechados e a poesia continuará viva.
Ótimo! Palavras e mais palavras foram soltas pelo ar,
pelo tempo, que no silêncio se transformam em músicas, poesias e livros.
Concretiza o não dito pelo dito, intensifica aquilo dentro de nos, os
sentimentos que são um só sentir, das nossas emoções e das nossas sensações.
Sem mais, flutuamos juntos em uma atmosfera, prontos para uma única viagem sem
volta, que pode ser a ida para algo mais complexo, mais profundo, onde não há
fendas para escapar.”
(Ana Ítala)
“Em um circulo de idéias e incômodos, circulo de
pensamentos homogêneos -Circulo dentro de quadrados, quadrados dentro de
teatro, teatro dentro de nós- nós (As feras) dotados de sentimentos, fulgidos,
sentimentos controlados, iniciamos uma nova vida, pois cada vez que saímos
daquela caixa preta saímos outros, tantos, OUTROS.
Engraçado! Nada é como era antes, ouvir sobre o nosso
processo é falar de experiências passadas, marcas não físicas, marcas
metafísicas, profundas e infeccionadas, marcas contagiosas. Quem é melhor para
falar sobre um corte, do que a própria faca/espada, ela rompeu cada micro fibra
da nossa pele, cada músculo do nosso corpo, cada órgão do nosso organismo. O
conjunto de letras, palavras, frases iam delineando da morte para a vida,
falando do processo em que se foi criando vários “monstrinhos”, as acusações
verberantes vieram da faca/espada, do ser responsável pela morte e pelo parto. Ser
este que todo soltinho brincava com as palavras, escrevendo com navalhas em
minhas costas.
O texto será publicado então morrerá, mas com a
metamorfose silenciosa ele já não será mais nosso e sim de um passado distante,
pois cada domingo são mais mil’anos que avançamos, sentimentalmente,
metafisicamente, fisicamente, literaturgicamente.”
(Elvis Torres)
“Paramos diante do estranho para ouvi-lo. Reconhecemos o
que nos chega, não necessariamente como nosso, mas que poderia ser. Essa
incerteza quanto a nossa presença no mundo permite que nos aproximemos de tal
modo da vida do outro que já não possamos friamente separá-la da nossa.
Ao ficarmos diante da história de um ser humano,
consentimos antes de tudo para que a vida se faça; olhamos em seus olhos e
deixamos que as memórias, imagens passem ‘entre vistas’. É um momento de
apoteose, desses de que a vida é feita e para os quais é preciso que existamos.
Talvez passemos cada um de nós nossas vidas em nossos
caminho individuais, buscando entender o todo ou mesmo já desesperançados de
achar respostas, quando, como num encontro de notas alta e baixa, criamos um
movimento harmônico: notas tão distintas e distantes se encontram e percebem
estarem dentro de uma malha maior, um pano não-plano em que as regras
aprendidas em vida não necessariamente funcionam ou são precisas, pois sentimos
que somos parte de uma obra grandiosa em que nossos corpos tão simples propagam
ondas sonoras, cada uma em seu tom, umas de tão mínima frequência, pianinhos,
outras quase estrondos, metais pesados – tudo para que se forme o grande coro
consonante, de movimentos ora uníssonos ora dissonantes, que seguem-se numa
ordem própria e nos levam sempre adiante, a um espaço e tempo desconhecidos
que, para que se mantenha a ordem, não nos cabe saber.”
(Rênier Vasconcelos)