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terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Em que medida um processo de criação reverbera em outros?

Como um processo de criação interfere em outro?

Em  2010, fizemos um blog de equipe e blogs de CEU.

Registramos alguns momentos de eventos, mostras e partes do processo de criação.

Através de um processo de criação de grupos virtuais, usando no primeiro ano um Blog como plataforma, e no segundo e terceiro ano, grupos no Facebook, venho desenvolvendo juntamente com Vocacionados, AOS e as equipes de coordenadores, novas meios de organização que este tipo de ferramenta permite gerar, relacionando em um lugar comum e de acesso rápido, diversas funções como: reconhecimento visual e contato virtual entre Vocacionados e AOS (mensagens instantâneas), compartilhamento em um grupo restrito de registros de processos criativos ou vídeos, textos, áudio, imagens, agendas compartilhada de ações (eventos), apresentações (agenda cultural da cidade)

O interessante deste tipo de canal/plataforma virtual é alimentar um contato direto, onde impulso parta mais do individuo para o coletivo, havendo uma troca entre ambos.
Esse ano, na equipe leste 2, tivemos 3 grupos acontecendo em paralelo:

1)VODA: surgiu em 2012, onde pesquisávamos vídeos e vídeos-danças, filmes, vídeos clipes sobre dança, corpo e movimento, atuais e históricos. Possibilidades de fazer e pensar as danças cênicas. Este grupo mantem-se, em diferente configurações e freqüências até o momento, contribuindo com a troca de conhecimentos e experiências em um nível mais aprofundado, além de um vasto registro de processos, referencias, organizados afim de que possam ser revisitados, mapeados.

2)CONEXÔES: Surgiu em 2013, na equipe leste 2, como proposta para ampliar o trabalho de troca de informações e processos dos Artistas Orientadores entre si, e também vocacionados, incentivando registros, comentários e postagens.Esse canal é importante pois permite que os vocacionados de diferentes equipamentos dialoguem mais entre si, mostrem referencias visuais e verbais de suas pesquisas, criações; organizem mostras, horários e ações culturais Permite também que se tenha acesso a uma agenda atualizada das apresentações dos próprios artistas orientadores, dos grupos do Vocacional e de outras tantas apresentações  pela cidade.

3)MOBILIZA: Este grupo foi criado nos 3 últimos meses do programa, a partir de uma necessidade um espaço comum virtual para se discutir o funcionamento do Programa, em uma parceria entre vocacionados, artistas educadores e coordenadores de equipe das 5 linguagens: Dança, Teatro, Musica,a Artes Visuais e Interlinguagens. O grupo inclui mais diretamente os Vocacionados no funcionamento e reestruturação do programa, permite um canal mais amplo e direto de comunicação e unificação das ações, processos dos grupos, coletivos; principalmente os que já atuam a algum tempo no programa, estimulando a troca entre eles e possíveis parcerias entre os mesmos, a partir de um gama maior de identificação, não ficando restrito apenas a sua região, equipe e linguagem.
  
Existem muitas dúvidas ainda na criação destes procedimentos, pois existem muitas questões sobre privacidade, comunicação, direitos autorais, realidade virtual, etc, que estão muito em discussão na atualidade. Mas tamo junto, se ficar o bicho come, se correr o bixo pega. Compartilhe!

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

IMAGENS DE OCUPAÇÃO DO TENDAL DA LAPA.

 
A. O. VERONICA MELLO - TENDAL DA LAPA - TEATRO
DE ONDE VIM E PARA ONDE FUI...
 
ASSIM COMECEI:
 
ensaiando pensamentos teatro vocacional tendal da lapa a.o. veronica mello
Entre mim e meus processos de inquietação
o que me liga ao que sou agora?
se tudo é passageiro, não se aprofunda, não se doa, não se cola?
o que me define como quem sou?
o eu? o outro? o que vejo e sinto?
hoje não posso escrever. minha melancolia não permite a razão, o discurso organizado.
vomito então. pulso. pulsão: somos doentes de nós mesmos? somos aprisionados a padrões estéticos, sociais, desejosos de formas e cimento. o cimento tenta aprisionar o que se é. ou gostaria de ser. um corpo nu é mais libertário, libertino, liberado do que aquele que se veste e se arma de verdades alheias. meu corpo nu se pronuncia dentro de minha roupa. traz à tona o que escondo.
hoje estou perdida. Elena. hoje a vida ganha um novo sentido com a morte. hoje eu me defino em perdas. hoje eu não consigo escrever. vomito.
melancolicamente retomo o pensamento sobre mim.  depois de tudo o que vivi nesta semana. o tempo se dilatou. semana longa. difícil descrever. onde está o desejo deles. o meu, pulsa embaixo de minha roupa. acho que devo despir-me também. aqui estou. precisando ficar nua. olhar as coisas sem suas máscaras. talvez seja possível. morrer mais uma vez.
vomito. onde está o desejo deles? lugar de passagem. onde estão os vínculos? onde nos encontramos e nos completamos? vazio. o espaço ficou grande demais. esperam demais de mim... será que posso alcançá-los? desnudá-los. enxergá-los como seriam se morressem. Elena. toca no fundo de minha melancolia. e eles? se tocam? porque não criam ligações reais? existe algo ali. existe um pulso... quase moribundo, mas pulsa. o mundo está moribundo. eles resistem. os que ficam, voltam transbordam possibilidades. mas eles sabem disso?
poucos pulsaram juntos. arriscaram-se ao abismo de não saber o que viria. tensos, mas inquietos. pulsam. será que eles sabem? o corpo parece saber que desejam mais do que a continuidade do tempo quotidiano.
uns desejam ser grupo, coletivo. outros desejam se tratar das travas, timidez. outros querem a fama. risadas. rs. engasgo. se você matar sua mãe vai se tornar famosa!!!!!! grito calmamente por dentro.
diz Aurélio:
Reputação, conceito; renome, celebridade.
prá que ele disse isso? penso em celebrar mais que celebridade. penso em puta e ação, mais do que reputação. vomito.
eles desejam algo. portanto voltam. mas o que? o que querem gritar? o que eles engolem? porque não vomitam? às vezes tenho vontade de forçar o vômito. mas espero. espero que percebam que precisam vomitar algo. não sei o que. não sei como. mas precisam. EU preciso. e o faço. às vezes menos do que gostaria. a rouquidão me impede de fazê-lo. o esgotamento dificulta a ação. mas acabo sempre achando um tempo. mesmo ele sendo assim tão cruel, impiedoso e rápido. eu preciso achar esse tempo.
dos grupos pulsos mais fortes. desejos desenhados. de onde vieram? como tomam forma? como sobreviver a tudo isso? à modernidade que não se vincula, ao amor e ao tempo de Bauman?
é possível mudar algo de fato? revolução? eles pulsam o ideal. mas não sabem ainda como se organizar. a arte pode ser revolucionária, terrorista, comendo pelas bordas? como?
a melancolia diminuiu. ficam palavras. vômito. o tempo parece ter estendido esta semana.
 
 
 
GRITEI. E PASSEI POR DIVERSAS TRANSFORMAÇÕES. DELÍRIOS ESTÉTICOS. OCUPAMOS O TENDAL DA LAPA. DELÍRIOS POLÍTICOS. TRANSFORMANDO O QUE SE DESEJAVA EM AÇÃO.











sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

ENSAIO RELATO KLEBER DE PAULA

ENSAIO RELATO KLEBER DE PAULA.

Faço uma linha dos 3 anos que estou no vocacional, no mesmo equipamento, com a continuidade dos mesmo vocacionados e a entrada e vários novos vocacionados que passaram no longo desses 3 anos.

CONHECIMENTO, DESCOBERTAS, PESQUISAS, REFLEXões, AUTONOMIA, EMANCIPAçAO E CRESCIMENTO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

          Meu ensaio vem como um conjunto de angustia, esvaziamento nos encontros, dúvidas, aumento da demanda "preenchimento nos encontros", medo do novo e do que não conheço, novas experimentações, descobertas e memória. Então coloco uma pergunta...Quando se dá o processo? Existe uma forma ou uma ordem para desenvolve lo? Com o início tardio do programa, me deparei com um “esvaziamento” significativo de vocacionados nas minhas aulas que me gerava dúvidas quanto ao desenvolvimento do programa quanto ao processo criativo, e o que seria processo. Aos poucos com o passar do tempo e encontros, voltei a ter uma demanda maior de vocacionados, alguns alunos antigos voltaram, novos alunos surgiram, todos com uma cede de aprender, fazer, executar, aprimorar e desenvolver tecnicamente como dançarinos.    Particularmente, eu não sentia dificuldades em proporcionar isso para eles, pois venho “desse mundo”, dessa prática de técnica-performance, desenvolvimento e crescimento como bailarino ou dançarino. Porém, não me conformava com a ideia de processo acumulativo de conhecimentos, de que meu trabalho com os alunos fosse construído e desenvolvido apenas com meras reproduções de movimentos. Minha angustias continuavam, porque não estabelecíamos um processo criativo.           As propostas e jogos que eu apresentava pra eles como uma prática corporal parecia ser perdida, parecia não ter uma continuidade. Sentia uma dificuldade em estabelecer um processo criativo, mesmo porque não sabia o que era processo criativo, foi a partir deste momento que comecei a me questionar: o que é processo criativo? Como estimular uma reflexão das nossas práticas e estabelecer uma pesquisa? Eu não sabia, e ainda não sei. Mas tinha certeza de que meu papel ao desenvolver este trabalho era ser um Artista Orientador " Provocador" . 
         Provocador: na minha visão, é aquele que não só dá ferramentas, coisas prontas, mas também aquele que instiga a curiosidade, a pesquisa, a descoberta e experimentação do novo, aquele que deixa de fazer as suas vontades para descobrir quais as vontades dos seus vocacionados. A partir deste pensamento adquirido com a minha formação acadêmica e principalmente com minhas vivencias como profissional da Dança, passei a buscar clareza nas minhas propostas enquanto professor-artista-pesquisador, de como realmente fazer com que meus alunos obtivessem a mesma clareza e que se sentissem transformados através disso. Algo muito significativo para mim, foi poder contar com o apoio da Equipe Leste 1: Ivo Alcântara, Enoque, Guilherme, Carol, Tatiana, Claudia Palma Coordenadora de Equipe. Através de nossas constantes conversas, reuniões e troca de saberes, percebi que eu poderia descobrir e estabelecer um processo criativo juntamente com os meus vocacionados partindo da vontade deles. Mesmo ainda tendo dúvidas de como estabelecer estas ideias na prática, passei a desenvolver nas minhas aulas um processo colaborativo de conhecimentos entre professor-aluno. Os vocacionados passaram a se sentir muito mais a vontade, para expor ideias e vontades em relação as nossas aulas, principalmente em relação à criação.
Atualmente voltando aos encontros, em nossas práticas na sala de aula, percebo uma vontade por parte dos vocacionados em se aprofundar e conhecer realmente as Dança Urbanas, principalmente sobre o Estilo “House Dance”, na qual encontraram certa afinidade. Os alunos querem saber origem, influências, onde surgiu, quem são os criadores, técnicas, história, fundamentos, enfim.... tudo sobre essa dança. Fui percebendo que os vocacionados começaram a fazer comparações e perceber semelhanças do House Dance com outras danças ou lutas, ou até algo que tenham vivenciado, coisas da memória particular de cada um. Partindo destas memórias e relações estabelecidas durante as nossas aulas, passamos a desenvolver um trabalho de pesquisa através de um questionamento: Todas as Danças podem ser “Iguais” ou “Semelhantes” ao House Dance?. Este questionamento surgiu em umas das nossas “apreciações” que acontece todo final de encontro, essas apreciações ou auto avaliação, surgem para que possamos fazer relações com o processo criativo desenvolvido na aula do dia e que também acabam se relacionado com aulas anteriores. Neste determinado dia uma fala muito forte nos marcou: “O MUNDO GIRA”, levando essa fala pra dança podemos chegar a conclusão que todas as danças se cruzam ou os passos se repetem, o que muda é a intenção de cada movimento, o feeling, a música. Desde então, os vocacionados começaram a aprofundar a pesquisa sobre as Danças que para eles dialogavam com o House Dance através de movimentos parecidos ou semelhantes, a maneira de andar, postura, atitude. Para essa pesquisa foi muito importante a opinião deles, a fala deles. Pedi para cada aluno escrever uma carta dizendo o que achava semelhante com o House Dance. Ao ler as cartas, percebi que todos pesquisaram a fundo e descreveram além das danças, as características de movimentos semelhantes ao House Dance, entre essas danças estavam: -O Samba: por causa dos movimentos de pernas e a forma de se deslocar. -A Capoeira e o Boxe: por causa dos movimentos de chão, e esquivas. -O Sapateado: por causa dos movimentos de pés, da maneira como usamos e tocamos no chão. -Do Afro: por conta de muitos passos semelhantes e movimentos de braços e mãos. -Da Salsa: por causa de alguns passos semelhantes, o contra tempo que usamos na música. Enfim, acho que estamos caminhando, não sabemos no que vai dar, e nem para onde vamos, mas estamos instigados para descobrir.

DUVIDAS, ANGUSTIAS E PENSAMENTO

Para a autonomia e emancipação, tens que ter o mínimo de conhecimento e consciência corporal, instrumentalizar o corpo é necessário para que possa se reconhecer dentro de uma linguagem ou estilo. Sendo assim, trabalhar técnicas, fundamentos, bases, e passar a historia da dança nos estilo que estais propondo não é processo? Improvisação é qualquer coisa? Cópia é qualquer coisa? Por onde você anda? Pra onde você vai? Como você anda? Pra mim, a dança é como o vento, que desmanchou o penteado arruadinho de várias certezas que eu tinha, e algumas vezes descabelou completamente a minha alma. Mesmo que isso tenha me assustado muito aqui e ali, no somatório de tudo , foi graça, alivio e abertura. Não precisamos de certezas estáticas, mas sim criar e reinventar.....

O QUE SOU PARA O MUNDO, O QUE O MUNDO é PARA MIM?


é um processo onde os vocacionados desenvolveram em cima de uma pesquisainterior, onde improvisar e expressar toda sua carga gen[etica, todas as expereiencias vividas no seu passado, sendo boas ou ruins, seu sentimentos. Colocar isso pro mundo, ver o que o mundo responde, absorver e transformar tudo isso em poesia corporal..... atravez de improvisacao. vocacional danca " de repente, sinto uma energia incrivel. que nem consigo explicar. que quem esta de fora pode ate critica. Mas quem vevenci, so tem a aproveitar quem nao acredita que experimente. Pois teoria por si so nao me satisfaz. Vivencie, sinta, dance. E, apos, critique me se for capaz."

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Invisibilidade - acerca do Programa Vocacional Interlinguagens no CEU Capão redondo

Segue, aqui, um ensaio acerca da Invisibilidade, assunto-norte que assombrou-me (Carolina Nóbrega) até que eu escrevesse sobre ele. Invisibilidade essa que em sua presença pouco tangível, pude ver, nas diferentes camadas que tangeram meu processo no Programa Vocacional Interlinguagens em 2013.
Preferi manter o ensaio em PDF ao invés de copiá-lo no corpo da postagem, para manter sua configuração... para acessá-lo, clique no link abaixo:

Invisibilidade_Carolina_Nóbrega

Um processo sensível para a história e outros procedimentos que quebram o vidro - Renato - Olido

Um processo sensível para a história e outros procedimentos que quebram o vidro.



Renato Vasconcelos
AO Dança - Galeria Olido



São dois os pontos de partida para desenvolvimento da pesquisa artística direcionada para orientação das turmas do Vocacional Dança na Sala Vitrine da Galeria Olido, um treinamento físico direcionado para o corpo cênico, realizado dentro de um recorte muito específico, que são as tendencias da dança moderna, e o universo poético e sensorial influenciado pela artista brasileira Lygia Clark.
Dois pontos que podem funcionar como rios de muitos afluentes, as vezes similares e as vezes antagônicos. Esses afluentes estão ligados as questões políticas, filosóficas, ideológicas, estéticas e históricas e também estarão relacionados aos princípios básicos da pedagogia do Programa Vocacional.
A escolhar pelo treinamento a partir de abordagens da dança moderna americana, se dá por dois fatos, o primeiro está ligado a demanda dos próprios vocacionados, pois os primeiros inscritos para os encontros de dança do Vocacional eram profissionais, que já estão acostumados com as técnicas de dança moderna e desejavam aproximar-se da minha orientação para uma troca de conhecimentos a cerca do assunto “dança moderna” e suas práticas corporais.
Todavia a minha orientação não pretendia aprofundar as bases da dança moderna americana, em termos de exercícios práticos, pois a minha formação técnica é bastante hibrida e por outro lado as premissas do Programa não visam tal desenvolvimento.
O segundo fato é histórico. A dança moderna americana encontrou em São Paulo um celeiro de artistas interessados em suas técnicas e a partir delas esses artistas construíram outras tantas técnicas, que foram favoráveis a história da dança contemporânea nesta cidade. (SIQUEIRA, 2006; pp. 104-5)
Sendo que Célia Gouvea, Gícia Amorim, Dulce Pessoa, Ruth Rachou, Claúdia de Souza, Sonia Mota, entre outros, fazem parte do quadro de artistas que estão ligados as tendencias técnicas oriundas da América do Norte e que de alguma forma fizeram parte da minha formação como artista, cidadão bailarino.
As questões técnicas da dança moderna e suas várias abordagens não estão limitadas a simples exercícios de treinamento físico mecanizado. Afinal como em qualquer outra vanguarda artística, a dança moderna está atrelada aos ideais de mudança dos paradigmas clássicos. E para que esses ideais culminem em arte é preciso que os envolvidos no processo cultivem forças interiores muito profundas, do ponto de vista humano, assim como a força de uma paixão, ou o sentimento de revolta diante da injustiça.
Essas forças e esses sentimentos foram corporificados pelos mestres dança moderna, Martha Graham, José Limón, Merce Cunningham, Alwin Nokolais, Hanya Holm entre outros. Cada um trouxe para si e para os bailarinos de suas companhias elementos de movimentação que fossem capazes de expressar o que eles pensavam, então as técnicas eram frutos de ideologias, de paixões e de uma necessidade imensa de mudar a realidade.
Ainda que eu e os vocacionados não consigamos juntos realizar os exercícios mais difíceis de uma técnica, nós tínhamos que nos apoiar em elementos gerais, presentes nas abordagens da dança moderna, para nos mobilizarmos criativamente.
Esse talvez seja um primeiro ponto de intersecção entre a abordagem do corporal, a inspiração em Lygia Clark e a postura política adotada pelo Programa Vocacional, que seria a emancipação.
Mas qual emancipação? Se atentarmos para as premissas pedagógicas do programa, entenderemos que essa emancipação está ligada a uma necessidade de mudança do comportamento geral do brasileiro, que sendo um povo colonizado culturalmente foi se tornando um povo dependente. Para que aconteça uma mudança no quadro político e social que nos assola é preciso uma tomada de consciência de si, dos outros e da nossa história, sendo assim, o material norteador do programa aponta:

Para o conceito de emancipação, objetivo que envolve toda e qualquer ação do Programa Vocacional, partimos da distinção elaborada por Paulo Freire. Para este educador, o ser humano com ser ético e consciente de sua infinita não conclusão, não é vítima de um destino contra o qual não pode lutar, mas é um ser que, coletivamente constrói uma história e é por ela construído. O ser humano seria, por natureza, livre, mas poderia não ter esta liberdade respeitada, mantendo-se aprisionado por condições sociais e culturais externas e impostas. (Proposta artístico-pedagógica: Material Norteador. São Paulo: Vocare – Revista do Vocacional. Ediçao comemorativa dos 10 anos, 2011.)

A principio seria incongruente falar de emancipação através do fazer artístico abordando as questões ligadas a cultura da dança norte-americana. Ocorre que o surgimento dessas danças foi fruto de mudanças sociais no começo do século XX, quando a Revoluçao Industrial ganhava seu ápice, e tais mudanças interferiram de tal modo nas produções artísticas de diversas linguagens (MARIBEL, 1989, p. 133), que para mim, como orientador de dança, as abordagens dança moderna servem como treinamento físico e como referencial de reflexão das mudanças que vem ocorrendo no nosso país.
Algumas questões para a pesquisa pedagógica durante o ano seria como aliar a ciência desenvolvida por Martha Graham, umas das líderes da dança moderna americana, que inspirou a maior parte dos coreógrafos dos EUA, que consiste em “três pontos essenciais: inspiração-expiração, memória motora e movimento percutante, isto é, poderoso movimento interrompido no seu auge”, o “cair e recuperar-se de Doris Humphrey, outra grande expoente da dança moderna americana”. (MENDES, 1985; pp. 67) e mais as associações e dissociações de tronco e pernas, música e dança que foram feitas por Merce Cunningham (AMORIM, 2000; pp.1000).
Aliar esses elementos físicos tinham o objetivo de dialogar com o objetivo maior do Programa Vocacional, que é instaurar processos criativos emancipatórios. Noutro ponto os processos criativos estão associados a expressão e a expressão está associada a um “tempo-espaço”, que não está neutro de história.
Se somos frutos dessa história, revê-la nos nossos corpos significa “ressignificar” e também refletir. As atitudes, gestos e posturas da dança moderna americana também fazem parte da nossa própria história da dança. E é só a partir da experimentação que o indivíduo consegue refletir e transformar. Nenhuma dança, seja brasileira, americana ou africana, ficou parada no tempo como obra de museu. O ser humano estava sempre mexendo nela e não deve ser diferente dentro de um programa que pretende a emancipação do indivíduo através de práticas artísticas que o levem a refletir sobre sua condição no mundo. Experienciar proporciona ferramentas para mexer e mudar.
Mas é a partir de Lygia Clark que fica possível lançar um outro olhar sobre os processos criativos, Clark será aquela inspiração artística e teórica que proporcionará uma ideia de não arte e uma desvinculação com a história. A professora Maria Alice Milliet analisando a obra da artista mineira, diz: “Existe em Clark uma crença nos recursos intrínsecos do homem, mas desidealizada. Não há modelo, nem norma: o que acontece é o processo de expressão e ao mesmo tempo expressão do processo.” (1992; pp 156)
Então nesse caso tanto faz os processos históricos, uma vez que, o que é intrínseco ao homem está dissociado de qualquer panorama histórico, com isso Ligya Clark lança a luz necessária para as premissas pedagógicas do Programa no tocante a valorização do processo. E indo mais fundo, quando a artista brasileira, pertencente ao movimento Neo
Concreto da década de 60, inverte o papel do artista que produz para o que propõe, ela traz à tona uma ideia de arte que não deve ser fruída, nem usada, mas experienciada “com todo prazer ou dor desse conhecimento que emerge num vir-a-ser corporificado e socialmente articulado.” (MILLIET, 1992; pp. 156).
É possível que a dança cênica esteja num vir-a-ser corporificado e socialmente articulado, mas para os cidadãos artistas envolvidos no Programa Vocacional , seja vocacionado ou orientador, tudo deve ser experienciado, sem objetivo de imitação ou perpetuação da tradição, mas para a instauração de um processo de alteridade, subjetividade e coletividade.
Realizar coletivamente pequenos exercícios pre elaborados com base em técnicas modernas pode gerar um sentimento de massificação a primeira vista, mas com certeza os ideais propostos durante a reprodução dos exercícios nada tinham a ver com massificação, antes pelo contrário, pretendiam questionar toda e qualquer estrutura no próprio fazer, mas também o acionamento de forças interiores que mexessem e transformassem as sensibilidades assim com objetivava Ligya Clark com suas propostas inovadoras.

Clark não aceita a arte como tempero cultural, diletantismo ou lazer, como exibição de status econômico ou de sofisticação intelectual. Pensa a arte integrada à vida como força transformadora capaz de desinibir nossos desejos , realizar o imaginado. Recusa a recorrer a procedimentos precodificados. Uma linguagem alterada ou alternativa deve resultar do encontro de pessoas envolvidas num fazer desprogramado. A vivencia de processos singulares do indivíduo e do grupo produzem eventuais mutações na subjetividade, tendentes a romper com os modelos dominantes. (MILLIET, 1992; pp 102).


Parece um contra senso apegar-se a dois modelos relativamente diferentes, algo que está ligado ao desprogramado, via Lygia Clark e de outro lado exercícios pré elaborados que fazem parte de uma tradição acadêmica recente. Mas tudo isso tem a ver com o paradoxo levantado durante minha formação acadêmica, quando então comecei a desenvolver o projeto “Lygia Clark de polainas”, onde toda a tradição de dança, desde o balé clássico até a dança contemporânea, seria colocada em cheque diante de novas necessidades expressivas.
Então a sensibilidade e a subjetividade proporcionadas por ambas as tendencias, Clark e tradição de dança, possibilitariam novos mecanismos para se dançar usando o publico de maneira efetiva na construção de sentido, sem necessariamente fazer com que ele se mexa, mas ao tempo suscitando nele uma gama de desejos reais que poderiam transformar o momento efêmero da comunicação dançada.
No caso da orientação na Sala Vitrine usamos entre tantos procedimentos de criação, um chamado “Beija Vidro”, em que dialogo com o espectador gera a concretização do trabalho. Os vocacionados passam batom e beijam a vitrine com diferentes intensidades, querendo que o público olhe e reconheça estruturas psíquicas de erotismo e sexualidade (fetiches e gêneros); passagem do mundo infantil para o mundo adulto; movimentos políticos como “existe amor em SP”, etc.
A participação se deu com olhares de estranhamento, inquisidores, mas também risos, deboches, outros beijos. Sem dúvida sem essas participações e respostas do público o procedimento se esvaziaria em termos de proposição poética. Pela vitrine o povo é chamado para perto dos artistas vocacionados e esses artistas se colocam a disposição do público numa indefinição de papéis. O interior do sujeito é remexido com as abordagens técnicas, não existe fronteira entre o mundo de fora e o mundo de dentro, assim como era para os dançarinos modernos.

A prática dessa nova sensibilidade emerge na luta contra a violência e a exploração, quando esta luta está comprometida com modos e formas de vida radicalmente novos: negação total do sistema, sua moralidade, cultura: afirmação do direito de construir uma sociedade na qual a abolição da pobreza e do trabalho resulte num universo onde o sensual, o lúdico, o calmo, o belo se tornem formas de existência e portanto a Forma da sociedade. (MARCUSE, 1969, APUD MILLIET, 1992, p. 103)

BIBLIOGRAFIA

AMORIM, Gícia, QUEIROZ, Bergson. Merce Cunnigham: Pensamento e técnica. Inn: Lições de Dança 2. Rio de Janeiro: Univercidade Editora, 2000.
FARINA, Amilcar, VILLARDI Fábio, BERNARD, Isabelle, DELMANTO, Ivan, GENTILE, Luciano, SCHMIDT, Luciana. Proposta artístico-pedagógica: Material Norteador. São Paulo: Vocare – Revista do Vocacional. Ediçao comemorativa dos 10 anos, 2011.
MENDES, Miriam Garcia. A dança – 1 edição. São Paulo: Ática, 1985.
MILLIET, Maria Alice. Ligya Clark: Obra Trajeto. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1992.
PORTINARI, Maribel. História da dança. Rio de Janeiro: Nova Froteira, 1989.

SIQUEIRA, Denise da Costa Oliveira. Corpo, comunicação e cultura: a dança contemporânea em cena. Campinas, SP: Autores Associados, 2006.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Ensaio Coletivo - Equipe Leste 4 - Rede Leste 4 - Vocacional Dança



Ensaio coletivo realizado pela Equipe Leste 4 - Rede Leste 4 - Vocacional Dança 2013

Em uma das nossas últimas reuniões conversando sobre o que escreveríamos em nossos ensaios, quais as questões do ano que ficaram mais evidentes para nós, quais os desejos, desafios, o que esse ano de programa (que para alguns foi o primeiro e para outros a continuidade de uma trajetória já iniciada) nos provocou, surgiu a ideia de criarmos um ensaio coletivo.
Pensamos na proposta de interligarmos nossos ensaios. 
Cada um de nós compôs o seu texto. 
Nos reunimos, lemos, apresentamos nossas ideias e fomos encontrando os pontos que dialogavam entre nossas reflexões. 
Cortamos, riscamos, rasgamos...
 Desconstruímos nossos textos individuais, colamos os fragmentos no papel, colamos também as frases escritas pelos vocacionados na nossa ação do Sareu em outubro, traçamos linhas que podem interligar nossos anseios de várias maneiras e assim, perceber os inúmeros caminhos que nos ligam.
O que de cada um de nós, AOs e Vocacionados, compõe essa Rede Leste 4?
Chegamos então a esse entrelaço e compartilhamos aqui esse nosso ensaio coletivo.




Apneia da Fragmentação. Ensaio-ficção_Nathalia Catharina. Coordenação Sul Interlinguagens



"Brasília é construída na linha do horizonte. – Brasília é artificial. Tão artificial como devia ter sido o mundo quando foi criado. Quando o mundo foi criado, foi preciso criar um homem especialmente para aquele mundo. Nós somos todos deformados pela adaptação à liberdade de Deus. Não sabemos como seríamos se tivéssemos sido criados em primeiro lugar, e depois o mundo deformado às nossas necessidades. Brasília ainda não tem o homem de Brasília. – Se eu dissesse que Brasília é bonita, veriam imediatamente que gostei da cidade. Mas se digo que Brasília é a imagem de minha insonia, vêem nisso uma acusação; mas a minha insonia não é bonita nem feia – minha insonia sou eu, é vivida, é o meu espanto. Os dois arquitetos não pensaram em construir beleza, seria fácil; eles ergueram o espanto inexplicado. A criação não é uma compreensão, é um novo mistério. – Quando morri, um dia abri os olhos e era Brasília. Eu estava sozinha no mundo. Havia um táxi parado. Sem chofer. – Lucio Costa e Oscar Niemeyer, dois homens solitários. – Olho Brasília como olho Roma: Brasília começou com uma simplificação final de ruínas. A hera ainda não cresceu. – Além do vento há uma outra coisa que sopra. Só se reconhece na crispação sobrenatural do lago. – Em qualquer lugar onde se está de pé, criança pode cair, e para fora do mundo. Brasília fica à beira."

Clarice Lispector. "Brasília: 1962".


ENSAIO-FICÇÃO

Apneia da Fragmentação

Peça dividida em "n" atos para ser encenada em  __/__/____.

A peça se passa em um tempo descontínuo, presente remoto entre o passado e o futuro, onde pássaros raríssimos cantam a cada aurora do dia e adormecem em silêncio acordando na manhã seguinte e assim sucessivamente (mediante a audição de seus cantos ao início de cada ato).

Propõe-se poucos diálogos, priorizando-se as rubricas a fim de permitir maior desenvolvimento artístico-pedagógico do coletivo de atores envolvidos da peça. A peça é proposta para um grande elenco.

Alguns personagens não estão elencados abaixo e portanto não aparecem no decorrer da encenação. Não existe nenhuma razão especial para isso, em geral se deve ao fato de terem estado presentes apenas no prólogo, no período inicial da peça. Existe um vazio proposital de rota dramatúrgica, como uma era mítica suspensa no tempo.

Não é clara a origem de cada personagem, sabe-se apenas que suas atuações são absolutamente interdependentes, sendo assim passam a peça toda em um jogo no qual a pergunta e/ou ação de um estimula a resposta e/ou ação do outro e assim por diante, sempre envolvendo o grande elenco.

Possivelmente outros personagens estão presentes neste jogo mas o autor tem desconhecimento sobre os mesmos, sendo assim estes não podem ser apresentados de modo verossímil ao leitor/ público.

O autor deixa uma última recomendação ao leitor atento, de ler esta ficção como se observasse a composição de um quadro, não porque acredite que com esta pintura dará conta de toda a história da arte, mas bem ao contrário, acredita apenas conseguir enxergar um efêmero, breve e quase invisível quadrante de uma grande tela.

Observação final: Esta peça não está terminada. Trata-se de obra aberta que pode ser finalizada por quaisquer pessoas que queiram dar continuidade à mesma (a partir da última frase escrita), assim como a peça também pode sofrer alterações na ordem das cenas, ou ainda receber a inserção de novas cenas que somem às já aqui apresentadas, modificando-se esta primeira proposta.

Elenco/personagens
A1
A2
A3
A4
A5
A6
A7
A8
ASS
AV
CEN
CES
COLEGAS
CP

Locações/cenários
Apartamento
Corredor
Lugar nenhum
Marginal Pinheiros
Marginal Tietê
Redondo
Sala de divisórias
Sala fechada
Teatro
NDA

Instâncias físicas e/ou conceituais
E
V

Sentimentos básicos
Amor, ternura, ausência existencial, tristeza, excitação, generosidade, calma, intensidade, prudência, indignação, paixão. Observação: Outros sentimentos poderão ser adicionados de acordo com cada personagem, proposição do ator e relação com o contexto da cena.







Ato 1




Prólogo
Locação: NDA
Luz âmbar sobe em fade-in
Ouve-se o canto dos pássaros raríssimos
Vê-se uma imagem idílica com o grande elenco suspenso (todos estão suportados por um fio preso ao teto de NDA) Pouco a pouco todos caem suavemente com asas coloridas abertas.
Luz desce me fade-out.


Cena 1
Plano aberto: a cena se passa em um trecho devastado de terra onde se ouve o murmúrio do vento em um som agudo e contínuo. O ambiente parece frio e inóspito.

Plano fechado: Sala fechada vazia.

Ouve-se o ranger da porta abrindo. Entra CES.

Corta.

Cena 2
Primeiro plano dos rostos de CP, CEN e CES.
Sala fechada

Os três atores abrem as agendas e pegam suas canetas em um gesto cotidiano. Se entreolham. Falam da vida durante poucos minutos. CES anota freneticamente qualquer coisa em um caderno, CEN ouve CP. Todos conversam e escrevem juntos durante algum tempo entusiasticamente. Os três devem se sentir plenos de energia e iniciam uma fértil discussão sobre meios e modos de produção, sobre educação, cultura, performance. Aparência saudável.

Toca o telefone. CEN atende e marca uma reunião para o dia seguinte pela manhã com E.

Cena 3
Marginal Tietê.
Cena ao fundo de uma manifestação que se encontra parada em uma larga avenida não longe dali.

CEN está dentro de um carro com um fone de ouvido falando com A3. Explica a situação à A3 que lhe diz que passa por uma situação semelhante na região de E.

Cena 4
Marginal Pinheiros
CES se encontra em situação idêntica à CEN na Cena 3. Fala com A4. (seguir as mesmas instruções da Cena 3, relacionando CES e A4).

Cena 5
Sala fechada - dia

CES conversa com E. Tomam café. Os dois personagens levam uma conversa agradável. São apresentados o funcionamento de V e de E. Toca o telefone. Ninguém atende. "E" conta que aquele era seu primeiro dia ali e que está disposto a ajudar no que for preciso. Ambos se servem de mais uma xícara de café e CES se dirige ao teatro.

Cena 6
Teatro - não fica evidente ao público se é dia ou noite.
Não há ninguém. CES então se dirige à Sala de divisórias no andar acima.

Cena 7
Sala de divisórias - dia
Música - sons que ecoam de um jogo de basquete
A7 e AV estão em grande animação. Vê-se uma cartolina imensa cheia de anotações. Participam desta cena CES, A7 e AV que discutem sorridentes o que estão preparando. Todos encenam algo utilizando objetos e sonoridades.

Cena 8
Lugar nenhum - noite
A4 telefona à CES. Explica que está em Lugar Nenhum junto a E. Este último diz que está com uma programação. A4 e CES mostram compreensão à situação pois observam que de fato E está disposto a fazer o impossível para acolhê-los naquela noite mas que de fato se vê sem saída. A4 se dirige ao corredor. AV segue A4.

Corredor - noite
AV e A4 iniciam com uma roda e conversam sobre a semana anterior, criam uma proposta para aquele dia no corredor tentando adaptar o programa criado em Sala fechada junto com CP, CEN, CES e A1-8.

Cena 9 - dia
Sala fechada
Encontram-se ASS, A 1-8 , CP, CEN, CES e Colegas.
Nota-se um sentimento de comunhão, todos os personagens se abraçam e cantam juntos durante aproximadamente 10 minutos. Em seguida ouve-se vozes dissonantes que ora se sobrepõem, ora apenas uma é ouvida, em seguida outra e assim por diante. Esse coro repete o jogo/partitura de comunhão e dissonância de vozes e abraços durante algum tempo, trazendo um mesmo ritmo para a cena.[1]

Cena 10 - noite
Apartamento
CES telefona a A6. Combinam um programa para o dia seguinte, discutindo calorosamente o que ocorrera com AV e E na semana anterior. Desligam o telefone. CES senta-se no sofá de seu apartamento, fecha os olhos. Em voz alta, como se dissesse para si mesmo, se dá conta do quão feliz está pois finalmente faz algo em que acredita, percebe que tem bons parceiros e que tudo vai bem. CES levanta, faz um chá. Toma o chá.

Cena 11
Sala fechada - dia
Encontram-se A1-8, CP, CEN e CES
Alguns se encontram deitados no chão, outros lêem um poema, outros dançam. Após algum tempo uma discussão é iniciada a partir das ações de cada um. Formam duplas, compondo o quadro cênico de modo aleatório, as vozes das duplas são ouvidas simultaneamente. As duplas se abraçam e se despedem, indo ao encontro de E.

Cena 12
Redondo - dia
Coro com A1-7, Colegas, E.
Todos dançam juntos, cantam, conversam sobre construção de subjetividades, parcerias entre a cultura e a educação, projetos de vida e traçam metas comuns para os próximos meses.[2]

Black-out

Cena 13
Locação: NDA - não se sabe se é dia ou noite
Luz âmbar sobe em fade in.
Aparentemente nenhum personagem ou cenário está em cena. No decorrer desta ausência de personagens, cenários e objetos é gerado no público um sentimento de vazio existencial que pouco a pouco se transforma em indignação porém, passado um breve tempo, um a um do Elenco vai adentrando a luz agora já a pino e um novo sentimento de paixão, intensidade, prudência e excitação começa a ser criado.

Longa pausa do grande elenco.

Luz desce em fade-out.

Breu - Suspensão do tempo









Ato 
2





Luz sobe em fade-in.
Ouve-se o canto dos pássaros raríssimos.


Cena 1
Para ser continuada.[3]


O mistério das coisas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas coisas cheias de calor.

Alberto Caieiro



Índice de notas:

[1] A Cena 9 pode ser repetida como uma partitura de ações e textos ao longo de todos os atos da peça sempre que o grande elenco democraticamente assim decidir. No geral ela obedece ao mesmo ritmo criado desde sua primeira aparição.

[2] É desejável que os dramaturgos se preocupem em retomar esta cena em algum momento no decorrer dos próximos atos.
[3] Nota em 1ª pessoa: O que é a coordenação de equipe do Vocacional Interlinguagens dentro do Programa Vocacional? Me parece ser um exercício de criação, apreciação, orientação e convite à reflexão sobre nossas ações artístico-pedagógicas (algo que fui descobrindo e me apaixonando ao longo do ano), é o espaço para prepará-las coletivamente para em seguida colocá-las a teste, recriando-as novamente. O que importa enfim não é estar ali com os vocacionados? Mas estar como, qual o programa? O que é criado e mobilizado ali? O modo - forma e conteúdo - a partir do qual instauramos um processo junto aos vocacionados é construído desde aquela mesa de reunião às segundas de manhã. A fragilidade na qual entramos neste segundo semestre (tornando nossos encontros quase ocasionais) contaminou não só nossos anti-seminários e nosso programa coletivo mas também a orientação, naturalmente. É condição essencial a conexão entre a reunião artístico-pedagógica e a orientação nos equipamentos, é o que nos dá coerência. No entanto me parece que é justamente nesse momento frágil que nos é exigida uma dose extra de coragem. Como é o trabalho na ponta? O que é a ponta, onde começa? Acredito que o plano total da ficção não é um caminho linear, não existe uma única seta, uma única direção, enxergo algumas trajetórias neste plano. Nesse fluxo e anti-fluxo que criamos, são ainda esses colapsos meu combustível para continuar e é na tomada de consciência da ruína das formas caducas e esvaziadas de sentido, da fragmentação da nossa percepção, que podemos igualmente nos perguntar para onde vamos, o que queremos, o que nos pertence e quais nossos programas: nos deparamos assim com um solo fértil para ser refeito, com a capacidade de ser reconstruído. Se quisermos, podemos olhar e ver apenas a terra devastada ou então vislumbrar daí a mudança e a transformação. Isso me parece ser interlinguagens.


segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Da utopia palpável às contradições presentes: E(sboço) de um longínquo maio para um cortante concreto fim 2013

Cena do espetáculo T.E.C.E.R. da Cia Bastarda



Por Marcio Castro[1]




“O Programa Vocacional tem como objetivo artístico-pedagógico a prática cotidiana - em cada equipamento, em cada espaço público e em cada sala de trabalho - da emancipação. Assim, a emancipação não é uma utopia longínqua, a ser perseguida em devaneios, mas é formada por práticas constantes de liberdade e reflexão, de ação e de apreciação sobre o fazer artístico, em infinito processo de investigação e descoberta.”[2]

Maio. Ao iniciar o ano com as orientações artísticas no CEU Aricanduva, acontecimentos verteram aos olhos que foram impossíveis de não serem relevados. Estes acontecimentos diziam respeito aos três grupos de orientação presentes no equipamento. Um dos grupos é a já conhecida Cia Bastarda; o outro é um coletivo recentemente formado pela experiência do encontro com o Vocacional no ano anterior: a Casa de Vidro, e o terceiro seria um grupo de iniciantes que figura como as demandas anuais já conhecidas pelo programa.

A Cia Bastarda é um coletivo que convive com o programa há cerca de cinco anos, e que foi contemplado pelo Edital do VAI em 2013 pela segunda vez, e nesta edição o projeto é o espetáculo T.E.C.E.R., fruto de pesquisa de um ano e meio em contato com o Programa Vocacional sob orientação de Valéria Lauand e que agora irá se verticalizar como acontecimento cênico através de uma montagem teatral.

O segundo acontecimento foi a formação da Cia Casa de Vidro que recentemente pleiteou junto ao programa orientação aos moldes de grupo e não como integrantes da iniciação, mesmo tendo uma demanda inicial pelo projeto no equipamento cultural,  que ultrapassa 30 novos desejosos de fruir teatro. E sabendo da necessidade de se fortalecer um grupo que tem intenções de seguir as suas práticas emancipatórias, nos vimos diante de um entrave, pois verificávamos estas demandas e ao mesmo tempo não tínhamos estruturalmente capacidade de abarcá-las – pois no equipamento apenas eu seria o responsável pelas orientações de teatro –  realidade que se estendeu para todos os outros equipamentos. Sendo assim, o mesmo programa que propõe as práticas emancipatórias esbarra nas condicionantes estruturais dela mesma para ampliar os seus processos.

A reflexão que se levanta é que, olhando para os processos pelo qual passa o CEU Aricanduva com seus coletivos, percebe se que o projeto utópico do Programa Vocacional, poetizado através da práxis proposta pelo MN[3] não é de nenhuma forma impossível, pelo contrário, é bastante concreta. A perguntas que se colocam para esta análise então são duas:

1: O Programa Vocacional tem como foco a emancipação artística. Portanto, como grupos com uma estrada a exemplo da Cia Bastarda continuam a serem orientados ainda segundo preceitos estruturantes de coletivos iniciantes? Será que não seria possível um pensamento de orientação que fossem mais específicos a estes grupos que já possuem uma história que perpassam as condicionantes atuais? Seria justo para o programa o desligamento destes grupos para que o programa se foque na orientação de novos coletivos oriundos? Já que necessidades de grupos com estas trajetórias como a Cia Bastarda são outras (inclusive com trabalhos mais aprofundados em demandas específicas, como interpretação, corpo, voz, dramaturgia, encenação, entre outros elementos do criar cênico), será que não conseguiríamos pensar em outras formas de orientação, como um núcleo de grupos onde as trocas transpassem a figura de um único orientador? Será que interlinguagens, projeto já existente no programa seria um formato a contento a estes grupos?

2: Como o Programa Vocacional que se propõe a instaurar processos criativos de emancipação, ao verificar que estes coletivos surgem não possui a estrutura de estimular a manutenção destes mesmo coletivos ou mesmo uma flexibilidade que permite de antemão a rearticulação de orientadores a fim de atender à estas demandas? E como também o programa pode criar outras demandas?

Esta reflexão se colocaria, ainda em maio como questão de análise que o programa Vocacional é vitorioso justamente porque percebe que tem forma de seus pensamentos propostos pelo MN tais resultados, porém a sua estrutura atual possui ainda entraves que sugerem uma reavaliação para além de complementação de verbas, e criar formas novas de articulação que, além de atender as demandas que o próprio projeto gerou e ainda gera, criar outras que ainda nem possamos medir, pensando formas de orientação que transcendem as já existentes para melhor pensar os processos de troca estabelecidos entre os artistas orientadores e artistas vocacionados, traçando assim uma fruição condizente ao momento histórico que vivemos.

                                                                             * * *

Chegamos em dezembro. Hoje já terminou a vida anual do Vocacional para os Vocacionados e Orientador, Coordenadores. A Cia Bastarda já estreou seu espetáculo T.E.C.E.R., que chegou num resultado muito impactante, poético, e também ainda em processo. Sai-se com a intenção de que os próximos caminhos do grupo versem pela pesquisa como sempre foi, mas que o espaço deixado pelas vírgulas do processo destinado principalmente à interpretação e treinamento sejam travessões longos dentro da estrutura documental artística que se transforma em cena. Aprendizados de trilha, roteiro, filme, iluminação, narrativas, estruturas, enfim. Coisas muitas. Coisas boas.

O grupo de iniciação apresentou no último fim de semana do projeto na mostra Regional no CEU Aricanduva seu processo dividido em duas partes: O Direito de Chorar, uma implosão da estrutura dramática televisiva que visava tentar reelaborar nossos discursos além das subjetivações estruturantes da novela brasileira que levamos à cena quando estamos iniciando nossa trajetória no teatro; e  também Retratos do Aricanduva, um experimento cênico-imagético de criações não dramatizadas que postulavam como desejos leituras plásticas, estéticas e éticas de seres em composição estáticas com mínimos movimentos, sem personagem, sem sentimentos: apenas gestos. Aqui, a presença nos encontros de Andrea Tedesco  - AO do CEU Tiquatira que veio me auxiliar diante da demanda do equipamento – foi crucial para acalentar crises, acalmar turbulências e inseguranças, fortalecer o processo de criação e parceria. Encontro feliz. Um desejo apontado na reflexão de maio que aparece aqui.

A Cia Casa de Vidro empolgada insuflou ar e perdeu fôlego nos idos de setembro. O projeto de reelaborar a fábula de Fausto no contexto do fim da quarta república nacional brasileira ganhou olhos brilhantes e efusivos. Contudo, a demanda do trabalho ainda exigia a presença maciça do orientador em todo o processo. Diante da empreitada, uma hora semanal que eu conseguia me desprender da iniciação para orientá-los se tornou pouco frutífero, pois ainda acredito eu, necessitavam de uma presença do AO de forma mais marcante e constante. Nos idos de agosto a figura excepcional de Andrea Tedesco tentou reequilibrar o barco, mas a escolha do coletivo Cia Casa de Vidro, diante de algumas ausências impactantes foi deixar na calmaria a embarcação, à deriva, e esperar os ventos de fevereiro e março para que o barco atraque no cais da criação.

                                                                               * * *

As perguntas talvez ficariam mais fortes lá em cima, talvez até retóricas se tentássemos justapor o ano com os anseios iniciais de um ano de orientação. Mas agora, com as águas  das chuvas que fortalecem o dezembro, sem querer fazer considerações fixas, aliar estas mesmas questões com o material concreto no qual chegamos pode nos levar a reflexões que auxiliem a pensar os novos caminhos do Vocacional, programa que se exige e nos exige comprometimento, alegria, engajamento e presença viva. Viva vocacional. Viva seus processos emancipatórios, viva suas crises, suas conquistas e suas contradições.





[1] Artista Orientador de teatro do ano de 2013 no CEU Aricanduva, equipe Leste 1.
[2] BENARD, Isabelle; DELMANTO, Ivan; et all. Proposta Artístico Pedagógica: Material Norteador. IN:   Vocare: Revista do Vocacional. Ano 1, Número 1. SP: Secretaria Municipal de Cultura, 2011. Pp 23.
[3] Material Norteador.