...um
mapeamento, um ensaio, um olhar sobre minha experiência:
construção
de um GPS Vocacional.
Abril e Maio/2013 – Alda
Maria Abreu
O encontro, ou melhor, os primeiros encontros com os vocacionados do CEU
Azul da Cor do Mar ainda revelavam muito pouco do que estava e do que está por
vir. Tenho clareza de que, por enquanto, consigo ver apenas a pequenina ponta
do imenso iceberg que se esconde dentro de cada um dos participantes das
coletividades que estou experimentando e que irão me acompanhar ao longo deste
ano de 2013 junto ao Programa Vocacional.
Nomeio de forma provisória estas coletividades, com a esperança de que o
tempo e a experimentação tornem visíveis os desejos criativos que ainda
encontram-se escondidos:
...Turma da tarde...
...Turma da noite...
...CEU Azul da Cor do Mar...
...Equipe Leste 3 de Teatro...
... Programa Vocacional...
Debruço-me sobre estas 5 coletividades, considerando a contiguidade entre
elas, considerando suas existências em forma de rede. E sob a ótica das tensões
e contradições evidentes, habito e componho com estas 5 coletividades, ficando
claro que estes espaços-tempo são muito mais do que um conglomerado de pessoas,
são muito mais do que espaços institucionalizados ou temporalidades
contratuais.
Mas afinal o que são
então? O que não fica claro? São coletividades, ou estão sendo? Uma dúvida
ontológica...
Este ensaio tem como objetivo primeiro a criação de um GPS Vocacional. Um
GPS para o que não está claro, para o que está icógnito, para o que desconheço
naquilo que conheço como Vocacional.
Assim como a bússula já foi capaz de orientar a localização espacial de
inúmeros aventureiros ao longo dos séculos, atualmente é o GPS a principal
ferramenta de orientação para aqueles que desejam aventurar-se por locais
desconhecidos.
Tentarei dar corpo a esta metáfora e para isso terei que subverter desde já
o significado da sigla GPS. Pois aqui ela está a serviço de nomear um Guia de Pistas/Perguntas para
Saberes/Sentidos, ou simplesmente, um GPS
Vocacional.
Para criar este GPS será preciso materializar perguntas e pistas capazes de
guiar os processos de construção de saberes e sentidos artístico-pedagógicos. Na
busca desta materialização de perguntas, engendro a partir de agora um
permanente exercício de indagação, dúvida e questionamento.
Ainda sem muita clareza do que virá a ser este “instrumento de orientação”,
mas impulsionada pelo desejo de aventurar-me nessas “coletividades/lugares
vocacionais” desconhecidos, dou início à criação deste GPS.
O que separa e o que
aproxima estes coletivos/lugares? Existe diferença entre a artista-orientadora
que transita por estas coletividades? Melhor dizendo, sou a mesma ao
experimentar cada um desses universos? Em que medida, ao reconhecer-me
estrangeira, forjo uma identidade na busca por aceitação? Como me coloco em
experiência junto a cada um desses coletivos e como cada uma dessas alteridades
colabora para a efetuação de minha experiência artístico pedagógica? Qual desejo me move para existir nestes
distintos e contíguos “lugares vocacionais”?
Ao encarar minha própria
existência como um projeto estético, em permanente tensão com os sentidos e
significados já preestabelecidos sobre a vida e o viver, efetivo o exercício cotidiano
de um existir que se quer mutante, provisório, em estado de construção. E ao duvidar
de minhas crenças mais fervorosas acerca “do que é teatro?”, coloco-as em xeque
sob a perspectiva desse estado criativo/construtivo.
Duvidar é o moinho
energético desse GPS Vocacional. Mas não se trata de uma dúvida paralisante,
mas sim uma dúvida-terremoto, que faz ruir minhas certezas cristalizadas sobre
o teatro, sobre a dança, sobre o aprender e o ensinar, reconfigurando em seus
destroços novos mosaicos de sentido, a serviço de um projeto estético capaz de
produzir “in lócus” possibilidades de experimentações estéticas inesperadas,
inconcebíveis, duvidosas.
Irrevogavelmente carrego esse ser-dúvida, esse projeto
estético-ético-político para dentro desses “lugares vocacionais”. Afirmo e
duvido-me nesses “lugares”, no espaço de fronteira entre eles, nos caminhos
percorridos e a percorrer na criação deste GPS Vocacional, que diferentemente
dos tradicionais, poderá e deverá promover desvios de rota, destinos
surpreendentes e becos sem saída, já que este GPS também deve ser compreendido
como um Guia Poético de Subversões.
Lanço-me em perguntas e questionamentos, subverto alguns caminhos
conhecidos e tateio outras rotas na construção desses “lugares”, reconstruindo
assim o meu próprio fazer dentro deles. Creio que somente ao encarar a
existência de cada um desses “lugares” à luz de suas intrínsecas
potencialidades estéticas é que será possível construí-los de fato. E
criando-os, talvez, eu possa também criar a mim mesma, sem perder de vista que
estas “coletividades vocacionais” são da mesma matéria da experiência,
portanto, estarão sempre inconclusas, como eu.
“Quais são meus momentos
de liberdade? O que eu quero dizer ao mundo? Para que fazer teatro?” As primogênitas
indagações que surgiram nas turmas de vocacionados do CEU Azul da Cor do Mar...
a pequenina ponta do iceberg, o início de um GPS.
Partindo dessas indagações iniciais, construí perguntas de pesquisa para
cada turma. Uma pergunta-motor, uma pergunta-alavanca, uma pergunta-trampolim.
E, atravessada pelas diversas instâncias da minha experiência Vocacional, segui
este mesmo procedimento e elaborei também perguntas-motores para os demais
“lugares vocacionais”, nos quais venho construindo e construindo-me
esteticamente desde abril de 2013.
Eis que surge então a primeira versão do GPS Vocacional:
...Turma da tarde...
Como construir junto aos
vocacionados convenções cênicas capazes de revelar para o público a existência
de múltiplas camadas de ficção? Como criar a lógica dessas convenções a partir
de uma vivência estética experimental, para além das convenções tradicionais? Quais
convenções performativas engendram este “lugar vocacional”?
...Turma da noite...
Quais vínculos afetivos
venho estabelecendo com a turma? Como adentrar nessa coletividade sem vestir a
carapuça do professor? Quais procedimentos tenho experiementado para despertar
o desejo estético dos vocacionados?
... CEU Azul da Cor do Mar...
Como eu convivo com o
fato de “estar estrangeira” nesta comunidade? Como esta comunidade está
convivendo com o “estar estrangeiro” do Núcleo de Ação Cultural do CEU?
...Equipe Leste 3 de Teatro...
Como subverter o
“planejamento de encontros e ações” por meio deste ato ensaístico?
...Programa Vocacional...
Como suportar a
contradição? Como subvertê-la positivamente?
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