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terça-feira, 27 de agosto de 2013

O Som interno - Ricardo Valverde


O Som interno
AO: Ricardo de Almeida Valverde/ Casa de Cultura Salvador Ligabue

            Há três anos venho trabalhando como artista orientador no programa Vocacional de Música da Secretaria de Cultura da Prefeitura de Sâo Paulo, e um fato interessante: orientar um grupo grande de vocacionados com muitas diferenças ( idade, religião , gosto e estilo, técnica no instrumento e conhecimento geral), vem me fazendo refletir bastante.
         A princípio eu achava que teria que encontrar um ponto em comum para conseguir dar uma boa orientação . Acreditava que se encontrasse essa unidade conseguiria estabelecer uma harmonia entre as pessoas e amenizar as diferenças entre elas ,proporcionando dessa forma um desenvolvimento musical coletivo.
            Porém logo percebi que isso seria uma utopia pois estaria indo contra uma característica formidável do ser humano; cada indivíduo é único e possui suas próprias competências e habilidades específicas. sendo assim , se cada indivíduo é diferente , a música dele também vai ser diferente da do outro.
   “Não existem duas pessoas com o mesmo mapa sonoro, assim como não existem duas pessoas com a mesma situação genética" nos coloca Silvia Goes, musicista e pedagoga.[1].
No livro, Silvia defende que cada indivíduo tem o seu próprio som interno e relata: " minha função não é formar músicos , mas sim tratar da música das pessoas para que elas consigam ficar felizes e satisfeitas com a sua expressão sonora e, mais ainda, para que aprendam a utilizar o canal do som em seu próprio beneficio : uma descoberta que traz equilíbrio , pois dela se consegue ver oque esta realmente acontecendo dentro de cada um."
Aceitando as diferenças e entendendo que cada artista vocacionado sente , escuta e produz música de uma maneira própria percebi que uma forma de orientar um grande e heterogêneo grupo de pessoas é fazer com que elas se descubram, ou seja ,conheçam seu próprio som interno.
     Para se chegar a descoberta do som interno a melhor ferramenta é a percepção musical . Portanto nas minhas orientações venho trabalhando muito a audição. Um exercício que utilizo no inicio , é o de fazer com que os vocacionados fiquem em silêncio por dois minutos e percebam todos os sons que estão no ambiente, perto ou longe. Este simples exercício pode ser feito para qualquer pessoa independente da idade e técnica musical.
      Então os primeiros trabalhos são o de fazer o indivíduo começar a perceber o seu som interno. E isso requer tempo e dedicação do aluno. " o crescimento de cada um depende única e exclusivamente de trabalho pessoal, que pode ser estimulado ou até mesmo orientado"[2]. Depois de estimular bastante a descoberta do som interno, o próximo passo é fazer com que o aluno comece a ter sua própria musicalidade , o fazer tocar único, ou seja, começar expressar o que esta dentro dele através da musica.
        Para ilustrar este trabalho , vou exemplificar com um exercício feito na orientação : faço uma roda com os vocacionados. Começo a tocar uma seqüência harmônica no violão: Am - Dm- G7- C7M e peço que cada pessoa improvise com o próprio canto . Esse exercício faz com que a pessoa trabalhe primeiro a percepção harmônica dos acordes e na sequencia com que ela produza melodias atraves da sua voz , se manifestando expressivamente .  Silvia Goes aponta que  "a compreensão leva ao movimento e o movimento leva a expressão ".
     Para concluir, preciso dizer que a busca do som interno e o fazer musical expressivo é um trabalho diário que faço como músico e acredito que o farei para sempre, pois sempre poderemos descobrir e reiventar a nossa propria música.


[1] GOES, Silvia. Cerebro musical. SP: Ed. Person, p.17
[2] IDem

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