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quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Marcus Simon no CEU Formosa


Programa Vocacional - Projeto Vocacional Música
Ensaio de Pesquisa
Artista Orientador: Marcus Henrique Simon
Data: 08/07/2013


As minhas orientações no CEU Formosa estão direcionadas principalmente à prática de conjunto de repertório de músicas brasileiras, a partir de músicas sugeridas pelos vocacionados e por mim. Trabalho também com a apreciação musical por meio da escuta de CDs trazidos pelos alunos e de exemplos musicais de áudio e vídeo que levo nas orientações. Discutimos e analisamos conjuntamente diversos aspectos musicais e estéticos, como forma musical, fórmula de compasso, instrumentação, estilo, performance, entre outros. Ouvimos músicas de estilos e artistas variados: Nirvana (rock grunge), Lelo Costa (vocacionado que compõe no estilo sertanejo/gospel), Radiohead (rock eletrônico) e Quinteto Amazonas (grupo de MPB do AO Marcus Simon). Exibi também o documentário “Hermeto Campeão”, sobre a vida e obra do músico Hermeto Pascoal. Além da escuta musical, desenvolvo dinâmicas de grupo com exercícios rítmicos, utilizando a percussão corporal e instrumentos de percussão. O intuito é trabalhar a noção de pulso e o entendimento dos ritmos em relação ao compasso e à pulsação. A improvisação e a memória rítmica também são estimuladas por meio de palmas, peito, pés, e outros timbres corporais, com ritmos simples de apenas um compasso.

As orientações são divididas em duas turmas (manhã e tarde), e contam atualmente com aproximadamente 15 participantes no total. Os vocacionados tocam violão, baixo, guitarra, bateria, teclado e percussão, e alguns se arriscam no canto. Possuem diferentes idades e níveis musicais, porém as referências e os gostos musicais entre os mais jovens são parecidos, indo de Milton Nascimento a Capital Inicial. Alguns possuem um gosto mais refinado e um nível musical acima da média em relação aos colegas. É o caso do vocacionado Guilherme, que aprendeu a tocar no violão a música “Travessia”, de Milton Nascimento, e “Quero me encontrar”, de Cartola; e do guitarrista Vinícius, que aprendeu a tocar com o pai músicas como “Carinhoso”, de Pixinguinha, “Bachianinha nº 1”, de Paulinho Nogueira, e “Brasileirinho”, de Waldir Azevedo. A presença desses alunos incentivam e estimulam os outros participantes a estudarem música e a ouvirem estes compositores.

O encontro de gerações distintas também possibilita uma ampliação do repertório de todos numa troca de saberes. A música “Tocando em Frente”, de Almir Sater e Renato Teixeira, sugerida pelo vocacionado compositor Lelo Costa, era desconhecida por alguns vocacionados adolescentes, até ser ensaiada e depois apresentada na Mostra do Vocacional no CEU Quinta do Sol e no Sarau do CEU Formosa. Esta música possibilitou a criação de um arranjo que tem como base dois ritmos do sul do Brasil e da Argentina, e que também eram novidades para os vocacionados: a chacarera e o chamamé. Estes ritmos trabalham com uma polirritmia de “3 pulsos contra 2 pulsos”, muito comum na musicalidade argentina e também africana. Em geral, a música de origem argentina, que veio a influenciar a do sul do Brasil, possui em sua estrutura rítmica acentuações que podem tanto ser entendidas como um compasso ternário simples (3 por 4) como um binário composto (6 por 8). Em espanhol é usado o termo “birritmia”, ou seja, um ritmo que pode ser escrito, executado e sentido tanto por uma determinada fórmula de compasso, quanto por outra. O que acontece na prática é que durante a música a melodia e o acompanhamento instrumental transitam entre subdivisões e acentuações binárias (3 por 4) e ternárias (6 por 8), criando um caráter ambíguo quanto à definição de métrica do compasso. O livro “Cajita de Música Argentina”[1], de Juan Falú, explica mais detalhadamente esse aspecto polirrítmico e traz informações históricas e musicais sobre os ritmos da música argentina.

Os vocacionados puderam experimentar na prática essa polirritmia, ao acompanharem a música “Tocando em Frente”, cantada e tocada ao violão pelo vocacionado Lelo. Pedi para baterem palmas em 3 pulsos, e pés em 2 pulsos, simultaneamente, e depois invertendo, palmas em 2, pés em 3. Para todos participarem da execução da música, criei uma frase rítmica simples para ser inserida no arranjo, tocada com palmas e baquetas, somada ao acompanhamento da bateria e da percussão. 

Pretendo continuar trabalhando com o repertório conhecido dos vocacionados, além de levar as minhas referências musicais de compositores que considero importantes da música brasileira e mundial. As orientações nesse estágio do Projeto estão muito voltadas para as apresentações nas Mostras. Os vocacionados ficam entusiasmados com o desafio de se apresentarem num palco, que é para muitos deles ainda um lugar desconfortável e, ao mesmo tempo, fascinante. No entanto, procuro conciliar aos ensaios  práticas de musicalização, apreciação musical e improvisação, além de conteúdos teóricos, que considero fundamentais para se adquirir melhor preparo e um amplo entendimento do fazer musical.

Como uma proposta de atividade de apreciação musical, farei um mapeamento das origens étnicas de cada vocacionado, e propor uma pesquisa na qual os vocacionados poderão discutir sobre a música dos povos de seus ancestrais. Serão exibidos alguns vídeos do Youtube com músicas tradicionais do folclore brasileiro, dos povos ligados à origem familiar dos vocacionados e de outros povos do mundo, como dos Pigmeus africanos, dos músicos do gamelão de Bali, e dos monges tibetanos, por exemplo. Cito abaixo alguns objetivos que tal atividade se propõe:

- Provocar a estranheza e a curiosidade do aluno pela música tradicional do Brasil e do mundo, a qual ele não está habituado a ouvir.

- Proporcionar aos participantes uma experiência musical auditiva e estética, por meio do repertório e de informações sobre a cultura e a musicalidade tradicional do Brasil e de outros povos do mundo.
- Ampliar o repertório musical dos alunos.

- Instigar a curiosidade e a pesquisa por tais expressões musicais, e estabelecer relações com o repertório conhecido dos alunos.

- Incentivar os alunos a frequentarem mais shows musicais, principalmente de artistas e grupos que buscam fazer uma música de qualidade, sem as padronizações estabelecidas pela indústria fonográfica e pela mídia de entretenimento.
- Estimular a escuta e a apreciação musical.

- Desenvolver a capacidade de discernir e identificar timbres e características de diferentes instrumentos e estilos musicais do mundo.

- Demonstrar as diversas funções possíveis que a música possui e a sua importância nas sociedades do mundo.

-  Desenvolver a compreensão da riqueza da diversidade cultural brasileira.

A partir dessa atividade poderei avaliar se é possível dar continuidade à pesquisa de músicas tradicionais do Brasil e do mundo e se há algum interesse dos vocacionados. Possuo um trabalho acadêmico de conclusão de curso de Licenciatura em Música intitulado “Oficina de Música Estranha - Musicalidades tradicionais do mundo: provocações para uma escuta sem preconceitos”. Este projeto apresenta uma pesquisa sobre a importância da etnomusicologia na educação e sobre diferentes expressões musicais tradicionais dos povos do mundo, além de uma série de atividades práticas relacionadas ao tema e de referências bibliográficas, de áudio e de vídeo de tais musicalidades. Planejo desenvolver algumas dessas atividades com os vocacionados, paralelamente às orientações e ensaios para as Mostras.

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